A Itália é um país que sempre influenciou de alguma forma os brasileiros. E hoje vamos abordar um aspecto dessa influência: o idioma. Mais especificamente um dialeto: o Talian.
Quando os primeiros imigrantes italianos chegaram no Brasil, lá por volta de 1870, eles não trouxeram apenas a força de trabalho e determinação. Eles chegaram carregando na bagagem algo também muito valioso: a cultura.
Naquela época, a Itália tinha se unificado como país recentemente (1861). Antes, existiam vários Estados separados, como a Península da Itália, Reino da Sardenha e Reino Lombardo-Vêneto.
Cada um deles era administrado de forma independente até a unificação. Assim, a língua italiana possui muitas variações dependendo da região.
Dessa forma, com a chegada dos primeiros imigrantes ao Rio Grande do Sul, vindos da região de Vêneto, um novo dialeto surgiu. O Talian se desenvolveu nas áreas de colonização italiana da Serra Gaúcha e permanece vivo até hoje.
Então, veja na sequência deste artigo mais detalhes sobre a história do dialeto italiano da Serra Gaúcha.
Migração italiana para Brasil: o primeiro passo para o surgimento do Talian
O Talian não existiria sem a migração italiana para o Brasil no século XIX. Naquela época, incentivados pelo governo, milhares de italianos desembarcaram onde hoje está localizada a Serra Gaúcha.
Boa parte dessas pessoas chegou da região de Vêneto. E, como mencionamos no início deste artigo, esta, assim como as outras regiões da Itália, tinha seu próprio dialeto.
Com o passar dos anos, o dialeto de Vêneto foi adquirindo algumas palavras e expressões oriundas do português. Na prática, muitas palavras foram “emprestadas” do português falado no Brasil.
Dessa forma, surgia o Talian, que foi se moldando durante décadas. Mesmo assim, ele não era um dialeto uniforme e mudava de local para local.
Ainda assim, ele permitia que as pessoas se entendessem perfeitamente. Isso inclui, por exemplo, o fácil entendimento entre os novos migrantes italianos nas colônias italianas no Brasil, especialmente na Serra Gaúcha.
Em suma, a migração italiana para o Brasil foi a grande responsável pelo surgimento do Talian. Mesclando a língua italiana (dialeto falado em Vêneto) com o português, surgia uma língua nova, ou melhor dizendo, um dialeto novo.
E ele permitiu por décadas uma melhor comunicação entre os residentes da Serra Gaúcha e os migrantes novos que chegavam anualmente vindos das diversas regiões da Itália.
Dialeto em extinção: medidas do Governo para manter o Talian vivo
Com o passar dos anos, o Talian foi se tornando um dialeto em extinção. Afinal de contas, ele era falado por gerações mais antigas. As gerações mais recentes foram perdendo o conhecimento desse dialeto, pois passaram a adotar apenas a língua portuguesa.
Assim, mais de 150 anos após a chegada dos primeiros imigrantes italianos, o Talian quase desapareceu. Atualmente, os descendentes de italianos que residem no Rio Grande do Sul, por exemplo, e querem saber mais sobre suas origens se interessam mais pelo idioma italiano em si, e não pelos dialetos.
Por isso que aos poucos o Talian foi desaparecendo (mas não por completo, como veremos a seguir). Além disso, muitos pesquisadores nem consideram o Talian como uma língua real. Eles definem esse dialeto como um cruzamento de vários outros além da mescla de elementos linguísticos portugueses.
Mesmo assim, o Talian ainda pode ser ouvido no Rio Grande do Sul, especialmente na Serra Gaúcha. Mas também em outras localidades dos estados do Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo.
Mas aqui temos uma questão interessante e peculiar. Muitos descendentes de italianos dizem que “falam italiano”. Só que, na verdade, a maioria não fala o italiano em si, mas o dialeto Talian.
Ou seja, o Talian está mais vivo do que imaginamos. Por isso o governo brasileiro vem tomando medidas para ajudar a manter o dialeto vivo. E a própria população também contribui para isso. Veja a seguir as ações que mantém o Talian ainda vivo no Brasil.
Patrimônio Cultural Brasileiro
Em 2014, o governo brasileiro utilizou um dado importante para transformar o Talian em um Patrimônio Cultural. Na época, estimava-se que o Talian era falado por 500 mil pessoas em 133 cidades brasileiras.
Assim, o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) definiu o Talian como referência cultural brasileira. Isso permitiu que o dialeto fosse incluído no Inventário Nacional da Diversidade Linguística.
Essa medida contribuiu para manter o dialeto vivo. Vale ressaltar que o Talian chegou a ser proibido no final da década de 1930, pelo governo de Getúlio Vargas (durante a Segunda Guerra Mundial).
Desse modo, o fato de o Talian ser considerado Patrimônio Cultural Brasileiro foi considerado um grande avanço visando a preservação da cultura e das raízes dos descendentes de italianos que vivem no Brasil.
Reconhecimento nas cidades
Várias cidades do Sul do Brasil valorizam o Talian. E não é para menos. Serafina Corrêa, por exemplo, é uma das cidades mais italianas no Brasil. Cerca de 90% da população tem sua origem advinda do país europeu.
Por isso o dialeto Talian é considerado a segunda língua oficial da cidade. O mesmo aconteceu em Farroupilha, onde um projeto de lei foi aprovado por unanimidade na Câmara de Vereadores em 2022. O PL instituiu o Talian como segunda língua oficial do município.
Já em Bento Gonçalves, o Talian é ensinado até mesmo nas escolas. Várias escolas da região dedicam um tempo precioso para ensiná-lo para as crianças e adolescentes.
E aqui temos um novo cenário: o Talian já não é mais transmitido de pais para filhos, como acontecia anteriormente.
No máximo, ele é propagado pelos avós e bisavós aos filhos, netos e bisnetos. Mas hoje em dia o Talian é transmitido por meio das ações que citamos até aqui, especialmente através das escolas e outras atividades organizadas pelo setor cultural de cada município.
Para os mais novos que ouvem o Talian apenas algumas vezes, esse dialeto é considerado uma “língua inventada”. Isso acontece porque eles não sabem da origem do dialeto e da importância que ele teve nas primeiras décadas após a chegada dos italianos no Brasil (especificamente no Rio Grande do Sul).
Cabe à sociedade e às cidades de descendentes italianos manter o dialeto vivo.
Além do sul do Brasil: saiba os demais Estados onde podemos ouvir o dialeto
Muitas cidades consideram o Talian como língua cooficial, ou seja, que possui o status de língua oficial. Na lista, a maioria das cidades pertence à Serra Gaúcha, incluindo municípios como Caxias do Sul, Farroupilha, Bento Gonçalves, Garibaldi, Antônio Prado, Flores da Cunha, entre outras.
Mas também temos o Talian presente em algumas cidades catarinenses, como Capinzal, Ipumirim, Ouro e Nova Erechim.
Assim, dois estados consideram o Talian como Patrimônio Histórico e Cultural: Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Nesses estados o dialeto se mantém mais vivo e presente no dia a dia das pessoas!
Porém, é ainda possível ouvir o Talian em alguns outros estados, como São Paulo, Mato Grosso, Paraná e Espírito Santo. Mas, nesses casos, o dialeto está presente em alguns poucos municípios, ao contrário do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, nos quais ele está mais presente.
Então, o Talian é um dialeto muito importante no quesito histórico, especialmente para a região da Serra Gaúcha. O grande desafio é manter ele vivo por mais tempo possível, preservando a história do nosso povo.
A Expertabi entende a relevância desse dialeto para o povo do Sul do Brasil. Por isso, entendemos que propagar esse tipo de conhecimento é fundamental para manter a história viva e repassá-la de geração em geração.
Por fim, queremos também indicar um curso gratuito do dialeto Talian. Ele ocorre de forma híbrida e é disponibilizado pela Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná e pela Associação dos Difusores do Talian. Se quiser saber mais, acesse esse link.